28 de set. de 2011

crônica de uma triste perda gastronômica



um dia, nos vimos sozinhos, sem gás no fogão e morrendo de fome. A opção foi uma pizza. nos últimos dias, havíamos tentado numas duas ou três pizzarias. ou eram caras ou eram ruins. esgotados os telefones anotados na agenda do celular no meio do trânsito, restou pesquisar na internet: pizzarias em perdizes. simples assim. na quinta ou sexta página da busca, surgiu um link de um texto em um blog de culinária, que contava a história engraçada de como o cara havia conhecido uma pizzaria que ele chamava de incrível. era mais ou menos assim: o cara e os amigos de role na vila madalena, voltando pra casa, avistam uma pizzaria com um cartaz anunciando cerveja em lata por R$ 2,00. achando o preço justo, os caras param, compram a breja e levam um panfleto com os sabores das pizzas. dias depois, o cara lembra do papel, pede uma pizza e acha do caralho.

a história interessante nos instigou e a pizza (do mesmo sabor que o cara do blog havia pedido) nos conquistou. isso sem contar o delivery de cerveja... quantas e quantas vezes a pizza não foi só a desculpa para mais meia dúzia de latas? os nomes das pizzas eram tão hilários que por muitas vezes questionamos a nacionalidade do proprietário e atribuímos, talvez injustamente, aos meus “lusancestrais” tamanha criatividade. durante os quase dois anos em que estamos morando aqui, raríssimas vezes ousamos “pular a cerca” e pedir em uma concorrente da nossa favorita. confesso: aconteceu de não resistirmos à tentação da pizza quadrada, só pra variar. nada de amor, só paixão. afinal, era com ela, e só com ela, que nós e nossos amigos-convidados nos fartávamos para valer.
hoje, sem mais nem porque, simplesmente a voz que atendeu ao telefone era outra. e o nome entoado em nada lembrava o do bonachão italiano. não era a pizzaria do blog, era outra, de nome romântico, nada que fosse capaz de nos fazer lembrar das delícias gastronômicas da bota européia. fomos friamente informados que a nossa queridinha tinha caído fora, vendendo seu número (e seus clientes, obviamente) para a tradicional pizzaria romântica da vila.
uma googlada e desistimos. não havia uma história de vida, uma experiência engraçada, uma crônica gastronômica, nada que pudesse fazer a diferença.
sobramos por aqui nós e nossa saudade da boa e velha meia brócolis e meia verona*, saborosamente ligada às nossas lembranças dos primeiros anos da vida de casados.

*metade brócolis refogado em azeite e alho e palmito picado, cobertos com mussarela de búfala e salpicado de alho frito; e metade bacon, lombo e azeitonas verdes cobertos com mussarela, sobre base de molho de tomates fresco caseiro e suporte de massa macia nas bordas e crocante no resto.

uma singela homenagem à saudosa cantina san gennaro, que em agosto do primeiro ano da segunda década do segundo milênio depois de cristo, encerrou a produção de pizzas com nomes duvidosos e sabor ímpar, deixando por trás dessas linhas de saudades um casal apaixonado, mas com o coração partido pelas circunstâncias econômicas que levam as microempresas brasileiras à falência.

e a foto é outra doce lembrança: o dia em que entramos no street view para achar o telefone de lá...

3 de out. de 2010

rotina


pode apertar, eu nem ligo.
nem liga? nem liga? depois você reclama quando fica roxo...
reclamo mesmo. não gosto de mordida, você sabe.
dane-se. eu mordo e quero que fique a marca!
não, não morde de novo! porra! no mesmo lugar?
gostosa!
filho da puta!
vem cá, pula no meu colo, vem! eu te agüento!
guenta nada! sou pesada...
você é gostosa...
sobe aqui, vai!
assim?
é, assim! gostosa!
podia passar a vida inteira agarrada assim em você... na real, eu podia morrer agora assim...
você gosta mesmo?
eu não gosto, eu amo! to cheia dos clichês hoje... puta que pariu, viu?!
adoro suas tetas...
gosta mesmo?
gosto...
então engole elas...
engulo...
caralho! não morde!
você é gostosa demais... vem cá, me dá um beijo...
só se você prometer não me morder mais...
não prometo nada... só se você deixar de ser gostosa...
só se você quiser...
eu não quero...
então vem cá e me engole inteira...

26 de mar. de 2010

estranho prazer #1

após passar toda a tarde tricotando, dona dirce espera dar seis da tarde pra sair de casa carregando panelas, potes, vidros, roupas, periquito e papagaio dentro de imensas sacolas plásticas e de tecido. arrasta tudo até o ponto mais próximo e dá sinal pro ônibus mais cheio que avista. Faz questão de aceitar o lugar que a mulher de 35 anos, (que acorda às 5:30 pra arrumar, dar café e levar os dois filhos à escola, passa o dia trabalhando de pé e agachada numa loja de sapatos do outro lado da cidade, volta pra casa só pra fazer o jantar, arrumar a casa, cuidar dos filhos e dormir as suas tradicionais 4 horas de sono) lhe oferece. desce num ponto próximo ao centro da cidade. Dá uma volta no quarteirão carregando suas coisas. senta-se por cinco minutos numa praça cheia apenas para descansar e volta para o ponto, para pegar mais um ônibus lotado em direção à sua casa.torce para chegar cedo. afinal, amanhã, quando der sete e meia da manhã, recomeçará sua via crucis de uma hora e meia até o centro da cidade com seus pertences, para dar a mesma volta no quarteirão, sentar por cinco minutos na praça apenas para descansar antes de pegar o ônibus lotado de volta para casa.os filhos e netos acham que ela está caducando.
o que eles não sabem é que ela sente um estranho prazer em se aproveitar da bondade alheia.

17 de dez. de 2009

no title

calma...
não se zangue...
tudo é meio lento, na verdade
a vida ocorre lentamente
são dias que passam sob o peso das horas
os incessantes minutos que insistem em se arrastar
os amargos segundos que se enchem de desespero
a vida só corre nos momentos bons
quando deveria parar
e nessas horas imensas de solidão
e nesses minutos regados de desilusão
e nesses segundos amargos de questionamento
tudo é muito devagar
mas calma, eu estou aqui
não que essa simples presença seja alento para um coração perturbado
não que um colo seja o suficiente para curar uma ferida
mas não vou deixar que a lança do desapontamento continue atravessando seu coração tão puro
não deixarei que a força do desengano consuma seus pensamentos tão cheios de genialidade
não deixarei que a crueldade das coisas acabe com tudo o que você levou tantos anos para construir
vem, deita no meu colo
deixa eu enrolar os cachos dos seus cabelos
deixa eu te despentear
deixa eu arrancar com meus dedos todo o sofrimento da sua alma
calma,
enquanto você quiser,
estou aqui para te ajudar...

21 de out. de 2009

insomnia

insônia é bom pra ficar sem dormir

deitado ao lado, o companheiro respira
é possível ouvir o som de suas células estabelecendo as trocas gasosas
entra oxigênio, sai gás carbônico
entra oxigênio, sai gás carbônico
entra oxigênio, sai gás carbônico
em cada uma das moléculas de seu corpo
infinitamente

do lado de fora, passarinhos adiantados não se cansam de cantar
um canto que só cansa
o canto perturbador dos solitários noturnos
e cada nota ecoa no fundo dos ouvidos
invade o cérebro e perturba a mente

nem a chuva é capaz de amansar os pensamentos
as gotas de vidro se chocam contra a capital de metal
e o estrondo de cada pingo é sentido como chumbo
e o tremor de cada trovão é convulsão de um corpo fora de lugar
e o clarão dos relâmpagos é um flash dos problemas correndo diante dos olhos que não querem se cerrar

a conta para pagar
a saudade da mãe, do pai, da irmã e da gata
a falsidade e a mentira de alguns
o trabalho que ficou para amanhã
o remédio pra tomar
as pessoas distantes e o desejo de um abraço
o medo da morte e da doença
o desejo da morte e da doença
devaneios, mentiras, verdades, dores, sentidos
bailam diante de olhos secos e confusos
ah, rivotril! como você faz falta aqui!

e cada problema se torna ainda maior
quando o sol da manhã começa a despertar
e a certeza de que o horário de verão só vem pra bagunçar
e a tristeza de ter que levantar
e a ansiedade de não poder fechar os olhos
e a angustia de não poder descansar
o desespero invade todos os sentidos como todos os raios do sol

nunca a música do despertador foi tão alta
e nunca a björk foi tão detestada
e nunca o frio foi tão intenso
e a conta pra pagar
a saudade da mãe, do pai, da irmã e da gata
a falsidade e a mentira de alguns
o trabalho que ficou para hoje
o remédio pra tomar
as pessoas distantes e o desejo de um abraço
o medo da morte e da doença
o desejo da morte e da doença
devaneios, mentiras, verdades, dores, sentidos e textos
fundem-se no corpo que se arrasta entre as gotas da tão constante garoa matinal
rumo ao ponto de ônibus
vão todos juntos
passar um dia perturbador, depois de uma noite perturbadora

Insônia é bom pra ficar sem dormir.

8 de out. de 2009

mais um para o dé

me tira daqui
me rouba
me esconde
me leva de toda essa loucura
e desse mundo que não é o meu
apaga todo o caos, a falsidade, a mentira
a moralidade de quem se esconde atrás de máscaras
não quero ouvir mais nada
tampa meus ouvidos com seus beijos
me lembra que eu sou sua e que só o seu mundo é o meu

me subtraia desse planeta
não quero saber mais de tão pouco
quero parar de respirar superficialmente
não me deixa me perder nesse mar de futilidades
me arrasta para as profundezas
me prende em suas guelras de amor
engole minha boca com seus beijos
me lembra que eu sou sua e que só o seu mundo é o meu

me cobre com a sua transparência
me envolve em seu abraço
e me embrulha em seus cobertores de vida
me embala nas canções das suas palavras
me deixa sentir a sua história que é minha também
não quero mais sentir nada
não me deixa sentir mais nada
me lembra que eu sou sua e que só o seu mundo é o meu

24 de set. de 2009

180º

minha vida passa em 180º.

São ciclos, que normalmente se encerram com uma nova mudança. um novo 180º.

esse é o início de mais um deles.

e se esse blógue vive desatualizado, a culpa é, em parte, desse novo começo.

no princípio, eram apenas sonhos, planos. de repente, a coisa tomou forma e a forma desenhou o medo. o pavor de navegar rumo ao desconhecido. mas, de mãos dadas, qualquer tormenta se torna garoa.

em 10 dias o plano tomou corpo, o medo virou combustível e uma nova realidade se desenhou diante de nossos olhos: somos, realmente, companheiros.

já temos as chaves e a partir de agora, o número 98 e o número 280 daquela rua que nos uniu são “as casas dos nossos pais”. Já não podemos chamá-las de “nossa”.

a "nossa casa", agora, fica no número 11. no apartamento 3. distante 4.700 metros das casas dos nossos pais. cinco minutos de carro e muitos anos de amadurecimento.

continuamos sendo filhos. mas, agora, também somos donos do nosso próprio lar.

uma guinada. um recomeço. uma nova vida. é o que ansiamos (e haja ansiedade em uma casa com dois portadores de transtorno do pânico!). é o que está acontecendo.

é só o começo e é bastante trabalhoso. são diversas coisas pra fazer, muita grana pra gastar, muito pepino pra resolver. mas temos dado conta de tudo.afinal, se embarcamos nessa é porque somos, acima de tudo, companheiros dispostos a fazer acontecer.

e vai!